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sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Mein Kampf Für Chico



Um belo dia de 2012, recebi um telefonema do Chico Amaro que me deixou emocionado. O Joaquim Francisco Amaro, meu ex-professor, consta no meu currículo como tendo sido meu orientador da graduação em Jornalismo lá na Universidade Estadual de Londrina, no Paraná. Pois eis que agora ele me liga para solicitar que o que eu fiz seja objeto de estudo da dissertação de mestrado dele! Fiquei pasmo! Agora, estou à espera dele aqui em São Paulo qualquer dia desses para remexer nas minhas caixas cheias de papéis velhos.

Para adiantar o serviço, coloquei em linhas retas minha vida torta. Levei algum tempo para espanar o pó da memória e fuçar nas caixas, pois algumas das informações que estão aqui eu ando omitindo do meu currículo há tanto tempo que não tinha mais certeza das datas ou se realmente aconteceram comigo.

Tudo começou quando nasci, em 1959.
Quase que não. Minha mãe passou um dia inteiro tentando. Cesariana era uma invenção muito recente. Só quando meu pai já estava pensando que tinha perdido família é que apelaram. O episódio traumático causou a minha filiação única. A Maternidade Nossa Senhora das Graças, de São José do Rio Preto, não é mais a mesma: fechou. Da minha parte, comecei fazendo graça com os tocos de lápis de cor da minha tia caçula, em Ribeirão Preto, quando passava as férias na casa da minha avó materna.

Minha mãe havia passado em um concurso público para ser professora do Estado de São Paulo e podia escolher entre as duas cidades de todo o Estado que tinha vaga para professora de Português e Inglês: Xavantes ou Nova Granada. Escolheu a mais próxima da casa dos pais. Da mesma forma, entre Nova Granada e Americana, meu pai escolheu a mais próxima de Uberaba, onde estava sua família, para ser dentista recém-formado, assumindo um consultório montado de um dentista “prático” que precisava sumir depois que sua atividade foi banida do Estado de São Paulo. Eles se conheceram no hotel onde moravam e se casaram em 1957. O filme do casamento deles foi autoria do primo dela, Lauro César Muniz, mais tarde autor teatral e de novelas de TV. Eu nasci 2 anos e dez dias depois, em 18 de julho. Meu aniversário é no mesmo dia do Nelson Mandela e do Vin Diesel. 


Entre as graças que fazia com os tocos de lápis e papéis de embrulho de padaria, uma que se destacou e motivo de muitos comentários na família foi a caricatura do meu pai, também Ralfo (não, não sou júnior nem filho), vestido de Zorro e montado no meu cavalinho de cabo de vassoura

Os vendedores de enciclopédias faziam fila no consultório odontológico do meu pai. Ele comprou Barsa, Delta Larrousse, Caldas Aulete, Lello, Conhecer e Trópico. Eu adorava a Trópico, li de cabo a rabo todos os dez volumes. Na contra-capa do décimo, de capa preta, tinha a foto de todos os presidentes da República do Brasil. Ele também me comprou “Eram os Deuses Astronautas”, “Semeadura e Cosmos” e “De Volta Para as Estrelas”, todos livros de Erich von Däniken, e me levou para assistir ao filme “Help”, dos Beatles. Nós assistimos juntos o homem pisar na Lua em julho de 1969, em transmissão pela TV Tupi, em preto e branco. Ele me tomava os nomes das capitais dos países e estados brasileiros e o nome de todos os 50 estados americanos. Ele, hoje com 82, me deu um violão e insistiu para que eu fizesse aula de datilografia. Minha mãe, 81, me ensinou inglês e português.

Entre 1972 e 1975 eu gastei minha mesada em cartolina, cadernos de desenho e as avançadíssimas canetas hidrocor. Fazia revistas de histórias em quadrinhos, desde a capa até tudo, desenhando cada página, gêneros que variavam entre humor, super-heróis e ficção científica. Cada edição, com a tiragem de um, passava de mão em mão entre colegas e professores. A periodicidade era variadíssima, mas tenho uma caixinha com quase 40, além de um livro de “romance de espionagem, meio sátira de 007”.
Por volta dos 12, 13 anos de idade, eu fazia revistinhas de quadrinhos de vários temas: humor, super-herois, ficção científica. Consumia minha mesada em papel, cartolina e canetas hidrocor, nas lojas da Daura e da dona Ninha, em Nova Granada. Cada revista tinha a tiragem de um exemplar, que era emprestada de mão em mão.


Uma outra destinação para a cartolina e as canetas hidrocor, além das capas dos gibis, eram os carrinhos da escuderia Bubu, com os quais o meu pai particularmente se entusiasmava mais: eu fazia miniaturas de carros, alguns réplicas de carros existentes, inclusive os da Fórmula 1, dos irmãos Fittipaldi e do José Carlos Pacce, e outros, eu inventava. Meu pai achava que eu teria futuro nisso, muito mais promissor do que como cartunista.

Também em 1975, eu colaborava com uma crônica por semana para o jornal A Tribuna, de Nova Granada, editava (com o colega Adel Charaf Eddine) o jornal mimeografado BIF (Boletim Informativo de Fofocas) distribuído no colégio (fomos chamados para falar com a diretora algumas vezes por causa do conteúdo dele) e cantava em bailes, quermesses e serenatas, às vezes composições próprias.

No ano seguinte, minha vida mudou radicalmente. Meu pai me mandou para os Estados Unidos, seguindo os conselhos de uma tia que tinha feito o mesmo com um primo no ano anterior. Eu ainda não sabia onde que eu iria cair para aproveitar meu intercâmbio cultural de seis meses. Um dos meus sonhos, além de imaginar se um dia seria possível eu ir à Lua tal qual eu vi na TV, era quem sabe poder ir uma vez na vida à Disneylândia, que foi inaugurada no mesmo dia em que eu nasci, só que 9 anos antes, em 18 de julho de 1950. 

Pois saí de Nova Granada para a região metropolitana de Los Angeles, em Downey, virei vizinho da Disneylândia (a original, não o Walt Disney World da Flórida) e estive lá quatro vezes só naquele ano, a última, no dia 4 de julho de 1976, o dia em que se comemorava 200 anos da Independência Americana, com direito a fogos de artifício, desfile de carros alegóricos com temas patrióticos dentro da Disneylândia e hino nacional tocado no sistema de som do parque.

Naqueles seis meses de 1976, publiquei tirinhas de histórias em quadrinhos nos jornais de duas escolas (The Loyalist, de Loyola High School, e The Norseman, de Downey High School), fiz a disciplina de “desenho a mão livre” (freehand drawing) em ambas as escolas e também um curso livre de animação com massinhas. Enquanto isso, minha atual esposa estava nascendo em Fortaleza, Ceará.

Voltando a Nova Granada, virei motivo de reportagem do novo jornal Dia e Noite, de São José do Rio Preto, que inaugurava a nova tecnologia offset na região e passei a colaborar com ele, com cartuns e tirinhas de HQ a partir de dezembro de 1976. O Adel escreveu alguns textos para o Dia e Noite em parceria com ilustrações minhas. No ano seguinte, 1977, lançamos o tablóide Estopim em Nova Granada, tendo como “jornalistas responsáveis” dois colegas do Dia e Noite, Nelson Homem de Mello e Clóvis Ferreira Lima. Nós simplesmente gritamos na redação do Dia e Noite “estamos lançando um jornalzinho em Nova Granada e precisamos de alguém que assine” e os dois levantaram a mão
Estopim, fase de Nova Granada. Em plena época da ditadura militar, não tardou para sermos intimidados em dar esclarecimentos sobre algum comentário irônico ao comandante da Polícia Militar local.


Eu fazia Faculdade de Direito, em São José do Rio Preto, à noite. Meu pai havia me perguntado, no final de 1976, “e agora, o que você quer fazer?” E eu havia respondido que não tinha muita certeza do que queria fazer, mas tinha certeza do que eu não queria fazer. Eu era péssimo com números e passava mal ao ver sangue. Eu me saía melhor falando com pessoas e escrevendo, talvez Jornalismo, Psicologia ou Direito, sei lá. “Ótimo, o vestibular para Direito está aberto”, ele disse. Eu prestei e entrei.

O José Hamilton Ribeiro (yes, da revista Realidade e do Globo Rural), diretor-responsável do Dia e Noite, vaticinou: “o Estopim não passa da quarta edição”. Então, nossa meta estava traçada: doesse o que fosse, tínhamos que provar que ele estava errado. Foram 11, mais ou menos mensal. Um dos diretores do Dia e Noite, o Amaury Júnior (yes, o Flash), publicou em sua coluna social ou em outras seções do jornal, várias notas sobre o Estopim. Por exemplo, em 23 de novembro de 1977, “Jornalzinho de Granada diz que a poligamia tende a aumentar” ou, em 4 de março de 1978, “Jornal de Granada está chamando o prefeito de palhaço” (era a fantasia dele no carnaval, ué). Tenho livros encadernados com recortes dos jornais. A tiragem do Estopim era de uns 300 exemplares e tinha uma receita mista de assinantes, venda direta nas ruas e anunciantes.

O pai do Adel me chamou para uma conversa e me pediu para convencê-lo a largar essa bobagem de jornal e ir estudar medicina. Eu consegui. Aí o Estopim parou. O Adel foi estudar medicina em Valença, RJ. Hoje o Adel é pediatra e vice-prefeito (reeleito) de Jacareí, SP. Além de nós dois, o Estopim tinha um exército de colaboradores. Quase todos seguiram suas vidas em profissões distantes do jornalismo, como o nosso repórter esportivo, o Lilica, que entrevistava jogadores e treinadores em campo, que virou gerente da agência do Banco do Brasil em Nova Granada. A única exceção foi o Ricardo Gandour, filho do dono da Tribuna e do cinema onde passei uma parte da minha vida (assistindo filmes a semana inteira ou brincando no salão vazio com o filho do dono e outros meninos), que era o nosso “foca colaborador” (conforme expediente), que hoje é membro do conselho editorial do jornal O Estado de S. Paulo, depois de estudar engenharia na Universidade Federal de São Carlos e especialização na Cásper Líbero.

A partir de dezembro de 1978, voltei a escrever crônicas semanais para A Tribuna, de Nova Granada, fazia cartuns para uma revista de São José do Rio Preto, a Primeira Edição (do Nelson e do Clóvis, que foram “responsáveis” pelo Estopim) e era assessor de imprensa do meu parente, prefeito de Nova Granada (aquele palhaço), fazendo um jornalzinho para divulgar as atividades dele, o Jornal do Barbudinho.

A partir de novembro de 1979, virei chargista diário do Dia e Noite e continuei colaborando com as crônicas para o jornal de Nova Granada, a Tribuna, que era tipografado.

O jornal Dia a Noite fazia oposição ao prefeito de São José do Rio Preto, Adail Vetorazzo, um sujeito esguio, magro, alto, com um bigodinho e um andar elegante. Me lembrava a Pantera Cor-de-rosa. Nas minhas charges diárias na página do editorial do jornal eu criticava o prefeito sem desenhar o Adail, desenhava a Pantera. Um dia, recebi, na redação, um telefonema de um assessor da prefeitura me perguntando se eu aceitaria um convite para ir falar com o prefeito.

Veio um carro oficial com motorista me buscar, entrei na prefeitura pelos fundos, por um elevador privativo, direto no gabinete do prefeito. Ao me ver, o Adail reclamou: “você está acabando comigo!” E eu justifiquei que seguia a política editorial do jornal. Então ele disse que estava mesmo era adorando, por onde ele passava, fosse no centro ou na periferia, as pessoas e mesmo as crianças gritavam “olha, o pantera!”. E todos queriam abraçar o pantera, tirar foto com o pantera. Ele me fez uma proposta: queria me contratar para fazer “panteras” para ele. E eu poderia continuar no jornal malhando o pantera lá. Então eu contei sobre a experiência como assessor de imprensa do prefeito de Nova Granada, para quem tinha feito o Jornal do Barbudinho, um panfleto que era entregue nas casas junto com a conta da água.

Assim nasceu o Jornal do Pantera, nos mesmos moldes, só que eu não fazia inteiro, como o do Barbudinho, havia uma equipe de redação, eu só ilustrava. Um dia o dono do Dia e Noite, o Adib Muanis, me chamou na sala dele: “é verdade que você está trabalhando para o prefeito?”. Eu confirmei e contei tudo como tinha acontecido. Não houve problema, afinal, ele já tinha outros com que se preocupar. O jornal faliu em agosto de 1980, depois de 4 anos de existência. Foi uma baita experiência no jornalismo de São José do Rio Preto. Anos depois de fechado ainda tinha gente procurando por ele nas bancas, eu testemunhei.

Eu não me somei à fila de empregados para receber alguma coisa da massa falida, com a venda das máquinas e equipamentos. Larguei para lá. Me lembro de, muito tempo depois (talvez eu já fosse advogado recém-formado, com escritório em sociedade no centro de São José do Rio Preto), eu dirigia meu Ford Corcel pelas ruas quando reconheci um japonês todo sujo, as roupas encardidas, num ponto de ônibus. Eu parei e lhe ofereci uma carona até na casa dele. Ele havia sido um dos melhores fotógrafos do Dia e Noite e, na falta de outro emprego melhor, sem receber os salários atrasados, estava trabalhando como borracheiro.

O Adail Vetorazzo foi reeleito prefeito, foi eleito deputado estadual e deputado federal. Eu fiz desenhos da Pantera para tudo, até camisetas para a tradicional missa dos motoqueiros (até os padres eram motoqueiros, uma missa campal, lotada de motos, muitos com a camiseta da Pantera numa moto). Os carros de som, durante as campanhas para as eleições, tocavam a música da Pantera Cor-de-rosa. Depois, foi secretário do Bem Estar Social da administração de Paulo Maluf na prefeitura de São Paulo.
Capa e detalhe da última página.


Recentemente, um livro foi escrito com a biografia do Adail. Eu e “minha Pantera” somos citados em várias páginas, inclusive na ilustração que encerra o livro. O autor do livro é o José Eduardo Furlanetto, meu colega de faculdade de Direito, que era jornalista da Folha de Rio Preto, para onde eu fui, como chargista, por indicação dele, depois que o Dia e Noite fechou.

Na verdade, antes de virar chargista da Folha de Rio Preto, voltei a escrever crônicas semanais para A Tribuna, de Nova Granada, e passei pela “A Notícia”, de São José do Rio Preto, que havia arrematado em leilão o maquinário do Dia e Noite e eu junto, levado pelo colunista social Cesar Muanis (irmão do dono do Dia e Noite, Adib Muanis), entre junho e dezembro de 1981.

Em 1982, um colega professor de inglês (eu tinha escritório de advocacia de dia, dava aulas em escola de inglês à noite e aos sábados), o Camilo Roberto, me convenceu a ressuscitar com ele o Estopim. Foram mais umas 12 edições (não tenho certeza), com o subtítulo “uma publicação da Grande Nova Granada e Região, órgão oficial de toaletes e lavatórios”. O Estopim, nessa fase, vivia de publicidade e era distribuído gratuitamente em postos de gasolina, com um espaço no cabeçalho para cada posto bater seu carimbo de “cortesia aos clientes”. Tiragem de mil exemplares.
Estopim fase de São José do Rio Preto, com o Camilo Roberto.


Cada edição era citada em colunas de outros jornais: A Notícia, Folha de Rio Preto, Diário da Região (com quem tinha começado a flertar, escrevendo cartas como um leitor comum, para o jornalista Mário Soler, que tinha sido colega de redação no Dia e Noite) e até pela Folha de S. Paulo, na coluna Panorama, da Terezinha Monteiro. “Veja que interessante concorrência pública foi divulgada pelo jornalzinho Estopim, de Nova Granada e que circula também nos subúrbios (como Rio Preto): acha-se na Secretaria da Câmara Municipal de Parafuseta, concorrência para a construção de um rio poluído sob uma ponte construída pela Prefeitura. O objetivo é retificar erro de cálculo e localização e possibilitar o emprego de modernas técnicas despoluidoras. A seção citada fornecerá todos os esclarecimentos quanto ao volume de água, vazão, ondulação, permeio, contaminação mínima para combate antipolucional, sabor, coloração etc”.

Em novembro de 1982 virei chargista diário da Folha de Rio Preto (levado pelo colega advogado José Eduardo Furlanetto) ao mesmo tempo em que fazia o Estopim e as outras atividades. Em 1983, o namoro com o Diário da Região rendeu: na edição do dia 13 de março, o Diário colocou nota no alto de sua primeira página, no canto superior esquerdo, logo abaixo do cabeçalho, entitulado “O Estopim no Diário (ou o Diário no Estopim ?)”, explicando que, a partir daquela edição, todo domingo, o Estopim seria uma página de humor encartada no Diário. Eu levei meus anunciantes para lá, inclusive a agência de turismo Rodojet, cujas peças publicitárias eram um cartum meu.

Além da última página do primeiro caderno da edição de domingo do Diário da Região, chamada Estopim, passei a ser requisitado para fazer ilustrações aleatória de matérias diversas, até que... em outubro virei chargista diário, na página do editorial, cumulando com o Estopim e ilustrações avulsas. Ainda escrevia três colunas durante a semana, com patrocinadores: “Autos & Motores”, ¨Tendências & Negócios” e “Notícias Rurais”.


Paralelamente, classifiquei minha música “Observador” no III Festival de Música Popular Brasileira com uma bandinha improvisada: um colega advogado no outro violão, Ivan (que parece que virou delegado no Mato Grosso do Sul), a filha do senhorio (o dono do imóvel para quem eu pagava aluguel do meu escritório de... aham... advocacia ou sei lá) como cantora, a Angélica (parece que foi morar em Israel) e duas outras pessoas que meu colega conhecia na igreja evangélica dele, um flautista e professor de cursinho e um garoto tocador de bongô. Nos apresentamos no palco do Teatro Municipal de Rio Preto vestindo pijamas e fomos novamente classificados para outro dia, para a final. Havíamos distribuído panfletos com a letra da música, cuja impressão foi patrocinada por uma editora, para a platéia cantar junto. Os jornais publicaram fotos e comentários sobre nós.

No outro dia, subimos ao palco fantasiados de prisioneiros (uma fantasia emprestada de um bloco de carnaval de Nova Granada, listrada de branco e preto na horizontal, com números no peito) e eu arrastava um planeta Terra preso na perna (uma bola inflável que peguei emprestada da vitrine da agência de turismo Rodojet). Ganhamos em segundo lugar. Nos deram um trofeuzinho (que não sei onde anda), saímos de novo nos jornais e recebemos uma graninha (não lembro quanto, talvez uns R$ 500 de hoje) que eu dividi com todos os integrantes.

Eu era convidado para dar palestras em faculdades, me chamaram para representar Rio Preto contra Limeira no Programa Sílvio Santos, em São Paulo, no quadro Cidade Contra Cidade, para responder perguntas de cultura geral (putz, caiu Noel Rosa, não fui tão bem, mas Rio Preto ganhou e seguiu no programa para uma próxima edição) e virei até jurado de gincana em colégio. A seção de cartas do Diário da Região frequentemente tinha alguma comentando uma charge minha. Lá em Nova Granada eu era o Ralfinho, o filho do dr. Ralfo, dentista. Em Rio Preto, quando meu pai dava um cheque em algum lugar, como um posto de gasolina, algumas vezes as pessoas olhavam o nome dele no cheque e perguntavam: “Ralfo? O que o senhor é do Ralfo?”.

O sistema do Diário era semi-offset. Eles economizavam com fotolito da página inteira. Os textos eram compostos pelas linotipadoras a chumbo em tiras de acetato transparente. As minhas ilustrações (tanto as charges, quanto as do Estopim ou as solicitadas por outras editorias) eram desenhadas direto com nanquim em cima de acetato transparente. Era feito fotolito só das fotos e algumas ilustrações reticuladas. Mesmo assim, eu cortava com estilete pedaços de retícula transparente e grudava com durex em áreas das minhas charges, para fazer algumas sombras e volumes. Então, toda página em acetato transparente recebia as ilustrações, textos e fotos e seguia para sensibilizar a chapa metálica que imprimiria na rotativa.
Estopim, fase página do Diário da Região.

Um sábado, eu fiquei até muito mais tarde no prédio do Diário, quase meia-noite, só para garantir que uma molecagem seria bem feita. Fiquei na oficina acompanhando até a hora em que a “rama” do Estopim seria montada como eu queria: de cabeça para baixo. Os montadores me questionaram “mas, de cabeça para baixo?”, confirmei e fiquei até o último minuto para ver a edição de domingo ser impressa e não ter como ninguém “corrigir” o problema. No dia seguinte, quem comprasse o Diário nas bancas de todas as cidades da Região, ou fossem assinantes, e chegassem à última página do primeiro caderno, a “contracapa” do jornal, perceberia o Estopim invertido. Ao virar o jornal, leria a manchete logo abaixo do cabeçalho do Estopim “Extra! Inédito! Nesta edição, o Diário da Região de ponta cabeça!” Foi o assunto do dia, a seção de cartas “bombou” (em termos de hoje) nas edições seguintes, mas, na segunda-feira, o dono do jornal, Norberto Buzzini, meio rindo, meio sério, disse: “se você fizer uma coisa assim de novo, eu viro a sua cabeça”. Os diretores de redação (Mário Luís) e comercial (Mazinho e Marinho), presentes, gargalhavam.

Em 1984, resolvi fechar o escritório (a escrivaninha e os livros estão lá em Nova Granada, ainda com processos nas gavetas) e ir estudar jornalismo. Não havia faculdade disso em Rio Preto. A mais próxima era em Ribeirão Preto, a quase 200km, terra dos parentes da minha mãe. Fui para lá, morar numa república de estudantes, dava aulas de inglês numa escola da mesma rede da que eu dei aulas em Rio Preto anteriormente, fazia o Estopim semanal e as charges diárias para o Diário da Região em “pacotes para a semana toda” enviadas pelo malote (gentileza) das Lojas Mahfuz (de móveis e eletrodomésticos, um dos patrocinadores do Diário, cuja sede era em Rio Preto e tinha filial em Ribeirão). Não tinham inventado e-mail ainda, fax quem tinha era só o correio, os jornais tinham telex, e a Mahfuz tinha carros semanalmente levando e trazendo documentos entre as duas cidades. Fui eu que bolei isso.

Os jornais de Ribeirão Preto eram todos (uns três diários) linotipados ainda, com a rama toda de metal, prensa plana, estavam atrasados em relação ao Diário da Região. Mesmo assim, além de tudo que fazia, também descolei uma coluna semanal em um jornal de Ribeirão, a Folha de Domingo. A coluna, de um quarto de página formato standard, chamava-se “Garapa” (Ribeirão é a terra da cana, né?) e era, basicamente, um requentado do Estopim com adaptações locais. Era tudo texto, com uma única charge, pois era preciso fazer clichê.

Enquanto isso, lá em Rio Preto, aquela editora, a Verbo, que patrocinou os folhetos do “Observador” preparava meu livro que seria impresso nas oficinas do Diário da Região. O Diário praticamente me deu isso, 2 mil exemplares. 700 foram vendidos entre a noite de autógrafos no Chicken-In (uma restaurante especializado em frangos) em Rio Preto e uma livraria da cidade. Depois fiz nova sessão de autógrafos em Ribeirão Preto, na biblioteca da Unaerp, com patrocínio da Coca-Cola local, dos biscoitos Mabel (que forneceram uns salgadinhos), do cursinho COC (Oswaldo Cruz), que imprimiu uns convites para expedir para a imprensa da cidade e da rede de livrarias (umas 6) Para-Ler, que colocou os convites no correio, além disso, organizou outra sessão de autógrafos em sua livraria do shopping numa sábado à tarde. Com tudo isso, foram vendidos menos de 200, acho.


Depois disso, “viajei” com o livro “Ralfo – 8 Anos de Humor”, montando banca do Salão de Humor de Piracicaba, em Londrina e em Curitiba. Ah, sim, também fiz uma sessão de autógrafos e venda na padaria Nova União, em Nova Granada. Tem uns pacotes de encalhe lá na casa dos meus pais, perto da escrivaninha de advogado.


Toda aquela minha trajetória por Ribeirão Preto se resumiu a agitados 6 primeiros meses de 1984. Enquanto isso, minha namorada (desde 1978, em Nova Granada, quando eu tinha 18 e ela 15), estava em Londrina desde o início do ano, havia passado no vestibular da UEL. Para o segundo semestre de 1984, eu resolvi ir atrás dela. Havia duas vagas oferecidas para transferências no curso de Jornalismo da UEL. Eu me candidatei. Minha namorada disse: “ih, é muito difícil”. Consegui uma. Comprei passagem de ônibus em julho para ir a Londrina efetivar a transferência e também procurar onde morar a partir de agosto. Perguntei para a minha namorada como era o nome daquela escola de inglês onde ela estudava, para eu tentar dar aula lá. Ela respondeu que era “Cambridge, a escola mais conceituada da cidade, seria dificílimo eu entrar lá”.


Cheguei em Londrina, comprei a Folha de Londrina, procurei anúncios de pensões, circulei algumas. Na primeira que visitei já fechei negócio, compartilharia um quarto com banheiro a partir de agosto com um japonês gordo, careca (calouro de alguma coisa, agronomia, acho) de São Paulo, que logo ganharia de mim o apelido de Buda, adotado por todo mundo. Só ao sair da pensão é que vi a escola Cambridge do outro lado da rua. Fui até lá e me apresentei a uma moça atrás de um balcão. Ela me deu uma “ficha” para preencher com meus dados e minha experiência prévia na língua inglesa. Preenchi ali no balcão mesmo, de pé, e devolvi para ela, mas ela ela me disse para eu entregá-la a um homem numa sala atrás de mim. Enquanto eu estava preenchendo o papel, pelas minhas costas, um dos donos da escola, Edson Buoro, fez sinal para a moça me mandar entrar. Ele leu minha ficha, inclusive com a informação de que eu viria morar do outro lado da rua, e já começou a me atribuir aulas, o papo todo em português. Não falamos uma única palavra em inglês. Ouvi tudo calado e só no final perguntei, intrigado: “escute, só uma curiosidade, você não me testou, não falou nada em inglês comigo, como é que você sabe que eu sou capaz?”. Resposta dele: “você não ousaria entrar aqui se não fosse”.

Tive uma nota publicada na Folha de Londrina em 28 de setembro de 1984: “Ele vem com tudo. O chargista Ralfo, da cidade paulista de Rio Preto e que atualmente faz o curso de Comunicação em Londrina, não deixa por menos e dá sua contribuição à greve da Universidade: hoje pela manhã ele estará lançando seu livro '8 Anos de Humor', no campus, e toda a renda será revertida em benefício do movimento. Beleza. Toda greve precisa de uma boa pitada de humor. Facilita a caminhada.”

Em outubro, outra nota no jornal, diz que Eduardo Baccarin lançará seu livro “Caminhada” de poesias no Bar Academia, na avenida JK, cuja capa é de autoria do “chargista Ralfo Furtado”. O namoro com a Folha de Londrina parecia que ia bem, em novembro teve uma matéria sobre mim de uma página tabloide do suplemento Folha da 6ª, com chamada na primeira página, com foto minha. Na matéria, caricaturas minhas do Tancredo Neves e Paulo Maluf, candidatos à presidência, Silvio Santos e do prefeito de Londrina, Wilson Moreira.

Enquanto isso, eu participava como cartunista de um fanzine chamado Fritada, fazia ilustrações para uma revista mensal chamada Cartaz, depois para outra chamada Roteiro, me inscrevi no concurso da música do Cinquentenário de Londrina (com minha composição “Londrina Querida” - interpretada por um grupo de colegas de república – Pedro, Marcos, Aurélio Albano – só levamos um troféuzinho de 'escolha do público') e convenci os donos da escola Cambridge que eles precisavam de um jornal interno. Aí nasceu o “The Cambridge Times”, em inglês, contando as atividades da escola, as festas, e trazendo textos e cartuns curiosos, sob a palavra final dos donos da escola na edição e com anúncios de lojas e agências de turismo da cidade, que pagavam as despesas com impressão e a mim. Depois que eu saí, eles chamaram o colega Alexandre Horner para dar continuidade ao jornalzinho.

Um novo reitor seria escolhido para a UEL. As fotos dos candidatos foram publicadas no jornal da universidade. Eu fiz uma caricatura de todos sentados “a la santa ceia” só que, ao invés da mesa, um pepinão. Entreguei a charge lá na redação do jornal, ao lado da reitoria. Deu espelho. Saiu publicada no “poster central” do jornal.

Enquanto isso, fiz uma visita à Folha de Londrina levando alumas charges e falei com o Walmor Macarini. Ele me disse para deixá-las lá, que ele encaminharia para “serem avaliadas” pelo pessoal do departamento de artes. Uns dias depois, voltei para perguntar o resultado da “avaliação” e ele me deu a conclusão: “infelizmente os seus desenhos não têm definição gráfica”. Passado algum tempo, uma daquela charges que deixei lá para “avaliação” sai publicada no alto da primeira página da Folha de Londrina, sem a minha assinatura: era o Sarney pulando cordas com a inscrição ao alto “presidente em exercício”. Telefonei para o Macarini para dar parabéns para ele, pois a Folha de Londrina já tinha atingido “definição gráfica” suficiente para publicar uma charge minha na primeira página. No começo ele se mostrou surpreso, nem sabia, depois, provavelmente com o jornal na mão, me xingou de tudo quanto foi nome e me mandou procurar meus direitos se eu quisesse. Desculpas nem pensar. Fim da minha relação com a Folha de Londrina. Não combina comigo esse tipo de gente.

Um dia, no começo de 1985, eu estava almoçando no Restaurante Universitário e um sujeito se sentou ao meu lado me perguntando: “você é o Ralfo?”. Ele tinha visto a caricatura dos candidatos a reitor no pepino. Era o Mário Benedito, que viria a ser meu professor de diagramação, me convidando para ir trabalhar no Jornal do Caminhoneiro (que depois virou revista Carga Pesada) a partir do número 2. Fiz ilustrações para todas as outras publicações da Ampla Editora (jornal da associação médica, da cooperativa de Rolândia, da cooperativa agrícola de Cambé, o Jaburnal e sei lá mais o que).

Continuava a mandar as charges diárias e o Estopim (que foi reduzido à ultima página de um suplemento tabloide) para o Diário da Região, de Rio Preto, em um envelope com a produção para a semana, por Sedex, dava aulas de inglês na Cultura Inglesa, na Littera e fazia frilas e ilustrações para a revista Roteiro.

Em 1985, o meu pai, que era provedor da Santa Casa de Nova Granada, foi convidado a fazer uma apresentação sobre o hospital em um congresso nacional de Santas Casas e me pediu ajuda. Eu fui a Rio Preto e contratei o fotógrafo Kharfan e o levei a Nova Granada com uma pauta de slides para ele fazer. Depois contratei o Roberto Toledo, da Rádio Independência (uma vez eu compus uma marchinha de carnaval para outro radialista da Independência, o Garcia Neto), para gravar um áudio em uma fita cassete a partir de um texto que eu escrevi. Resultado: passava os slides no carrossel sincronizado com a fita cassete. Eu mesmo fui o projecionista no dia da apresentação no congresso, em São Paulo.. Isso me rendeu um convite de trabalho em São Paulo: o presidente da Federação das Misericórdias disse que, depois que eu terminasse o curso na UEL, se eu quisesse ir para São Paulo, o cargo de assessor de imprensa era meu.

Em 1986 me casei pela primeira vez. O casamento foi em Rio Preto. Já morávamos em Londrina desde 1984 gastando dois aluguéis e pareceu lógico juntar as coisas. Com o fim do curso de Jornalismo na UEL, no começo de 1988 nos mudamos para São Paulo e assumi o emprego na Federação das Misericórdias. Criei o jornal tabloide mensal “Novo Rumo”, distribuído para todas as Santas Casas do Brasil, e lancei a candidatura a deputado do médico e provedor da Santa Casa de Pindamonhangaba Geraldo Alkmin Filho, com uma entrevista de duas páginas. Eu também ajudava na organização de eventos, bolava cartazes, panfletos, distribuía releases para a imprensa, participava das reuniões e das visitas a autoridades para reportar no jornal.

Ao mesmo tempo, procurei o Joel Lois, editor do Suplemento de Turismo do jornal O Estado de S. Paulo, que era amigo de infância do meu pai lá em Uberaba. Ele me deu uns frilas (não podia contratar, estava com todos os cargos de redação ocupados). Fiz uma matéria que ocupou seis páginas inteiras, sobre Los Angeles, com fotos minhas e até uma ilustração na primeira página, colorida, uma caricatura de Los Angeles sobre uma laranja gigante. Depois fiz uma matéria sobre San Francisco, de três páginas do Estadão. Então, um dos repórteres tirou férias e o Joel me colocou como substituto. Cobri a eleição do Sindicato dos Hotéis Bares e Restaurantes, na qual o Vitor Oliva, do Gallery, era o candidato da oposição(e perdeu) e a preparação das escolas de samba de São Paulo, com a publicação da letra do samba-enredo de cada uma e o tema de seus desfiles.
Minha ilustraçãp saiu na primeira página do Suplemento de Turismo do Estadão, como chamada da minha matéria sobre Los Angeles, que ocupou 6 páginas.

Enquanto isso, mandava as charges diárias e o Estopim para o Diário da Região, de Rio Preto, agora por fax. Em algum ponto, que agora não lembro com exatidão, o Estopim deixou de ser Estopim. Estava em alta o desenho animado do He-Man (que gritava “pelos poderes de Greyskull!”), então ele foi transformado (a mesma última página do suplemento tabloide) em Ri, Mãe! - com o subtítulo “Pelos poderes do bacon!”, e era cheia de porquinhos em todas as brincadeiras, piadas e passatempos.

Fiz uma visita à Folha da Tarde (no segundo andar do prédio do Folhão) e, quando mostrei o texto sobre Los Angeles que fiz para o Estadão, o Adilson Laranjeira (que é fanático por cinema) chamou o Chicão (Chico Lang) e mandou me empregar: “coloca ele pra falar inglês quando tiver de entrevistar algum gringo”. Virei repórter da Geral: cobri show da Xuxa, roubo de carros, reportagem sobre praças pitorescas e condomínios de luxo, colecionadores de canetas, explosão de depósito clandestino de butijões de gás em São Bernardo, campeonato de motocross em Campos do Jordão e traslado de corpo de nadadora brasileira (que morreu ao tentar atravessar o Canal da Mancha) que chegaria em Santos, pautado por Laranjeira, Carlos Brickmann e Chico Lang.

Meu horário na Folha da Tarde era das 13h às “18h” (algum dia eu fui pra casa às 19h ou 20h, outros às 22h e até 23h), inclusive domingos. Meu dia de folga era sábado. Todas as manhã, eu “batia ponto” na Federação das Misericórdias. E fazia as charges para o Diário e as ilustrações para a Carga Pesada. E ainda virei correspondente da Carga Pesada também: ia aos bastidores do programa do Bolinha, na TV Bandeirantes, ou do Perdidos na Noite, do Faustão, na Record (na verdade, no Teatro Zácaro, no Bexiga) entrevistar os próprios (o Bolinha dizia que ficou satisfeito com a entrevista que publicamos dele, que ele sempre se aborrecia com jornalista que distorciam o que ele falava, mas que eu fui fiel) e seus convidados: Gretchen, Rita Cadilac, Mara Maravilha, Maguila, Genival Lacerda, Lilian Ramos, Alice de Carli...

No final de 1988 meu casamento acabou. Eu fui embora, dormir em um hotelzinho (Hotel Canadense) em frente à Folha. Um dia, na redação, vendo minha cara, o Chicão perguntou o que estava acontecendo e eu contei. “Ah, é isso? Quando você estiver no terceiro casamento, como eu, você se acostuma. Está precisando de alguma coisa?” Eu falei: “Estou alugando uma kitchnete, preciso de um fiador”. E ele: “onde eu assino?”.

Perto do Natal, o Chicão chegou bem pertinho de mim, na redação e disse baixinho: “vou te dar um presente. Vou te demitir!”. Eu estranhei o presente, mas ele explicou: “Eu te demito, você recebe uma grana, esfria a cabeça, vai se divertir no final do ano, depois você volta e eu te recontrato”. Fui e não voltei. Eu tenho uma regra de não voltar para onde eu tenha saído. 

Em 1992 fui demitido do Diário da Região (uma nova equipe assumiu a redação e trocaram todo mundo, trouxeram até um chargista novo). Viajei lá para São José do Rio Preto para dar “baixa na minha carteira”.

No final desse ano, eu e minha segunda esposa e sócia, começamos o “Jornal do Centro” (subtítulo: “O Jornal do Nosso Bairro”) e também distribuímos minhas charges para jornais do interior de SP, PR e MG. Tivemos jornais-clientes em Apucarana, Itu, Guarulhos, Alumínio, Pereira Barreto e Pará de Minas, que pagavam um valor mensalmente para receber minhas charges (as mesmas para todos) por fax.
Estopim fase Jacareí.

Nessa mesma época, o Estopim ressurgiu em Jacareí (onde o Adel é pediatra e, hoje, vice-prefeito), não me lembro quantas foram as edições, talvez menos de 10. Eu editava (acrescentando charges minhas) e imprimia em São Paulo com os patrocínios que o Adel conseguia lá, por iniciativa e insistência dele. Era um tabloide de 8 páginas e, talvez, mil exemplares de tiragem.

Sobre o “Jornal do Centro”, tudo começou quando eu fazia o Novo Rumo, jornal tabloide mensal que criei para a Federação das Misericórdias desde 1988 e, na gráfica onde ele era impresso, eu via jornais de vários bairros de São Paulo que também eram impressos lá. Como eu sempre morei na região central, o meu “bairro”, o pedaço da cidade com o qual tenho afinidade, para o qual quero melhorias, quero saber a história, as atividades, a programação de eventos, é o centro.
Furtaram a estátua da Praça da República. Esse era um assunto tipicamente relevante para nossa primeira página, patrocinada, entre outros, pelo Páteo Maria Antonia, da maravilhosa Sandra Papaiz. Antes da primeira edição do Jornal do Centro, apenas com uma folha de papel milimetrado na mão, de rascunho, eu a procurei e expliquei as minhas intenções. Ela me interrompeu e perguntou: "quanto é minha parte?" Durante todos os 4 anos de circulação do jornal, o patrocínio do Pateo esteve acima do cabeçalho, no canto superior direito da primeira página. Uma coluna em inglês, na primeira página em toda as edições, resumia os assuntos relevantes para os estrangeiros que estivessem hospedados no Hilton da Ipiranga ou no Othon da Líbero Badaró.

O “Jornal do Centro” tinha formato standard, 8 páginas, 3 mil exemplares, distribuição gratuita (e assinaturas: apenas o valor do correio) quinzenal. Fazíamos quase tudo: vender publicidade, escrever, fotografar, desenhar charges, distribuir, cobrar. O “quase” é porque tínhamos colaboradores, não remunerados, gente que gostava de escrever sobre a programação de rádio, de TV, de cinema, de teatro, horóscopo e mais um monte de assuntos, com colunas fixas, gente que também morava na região e queria ajudar. 

A distribuição era feita em cafés, padarias, restaurantes, hotéis, supermercados patrocinadores e até bancas de revistas (tinha uma seção que homenageava os donos de bancas de revista: a cada edição saía uma foto de um deles com um pequeno texto, assim, eles colocavam o Jornal do Centro de brinde de encarte dentro das revistas e jornais que as pessoas compravam). A área de distribuição e cobertura de assuntos se estendia da Santa Cecília até O Páteo do Colégio, e da Estação da Luz à igreja da Consolação. A experiência durou 4 anos, até outubro de 1996, o mesmo tempo de vida do Dia e Noite de São José do Rio Preto (entre 1976 e 1980).

A demissão do Diário em 1992 foi triste, mas o fechamento (por decisão minha, depois de dois processos na justiça e dificuldades financeiras) do Jornal do Centro em 1996, foi o maior trauma. Entrei em depressão e tive pesadelo até recentemente, acordava no meio da noite sonhando que estava no fechamento da edição. Foi um corte na carne da alma.
Patrocínios como os do Mappin, Citibank, Credicard e McDonald's (que publicava um vale McBatatas na primeira página, para ser recortado e resgatado no restaurante da rua São Bento) eram motivo de grande comemoração: davam prestígio e respaldo ao Jornal do Centro e poderiam atrair outros anúncios. Eram meses de empenho e esforço para se conseguir um desses.


Em 1995, nós alugamos uma sala numa galeria no centro de São Paulo, para atender o público, muita gente vinha colocar anúncios classificados no Jornal do Centro. Só que, em virtude da minha participação, desde 1991, das reuniões e encontros de fãs da série de TV e cinema “Jornada nas Estrelas”, a sala do Jornal na galeria, virou ponto de encontro desse pessoal, que passou a deixar objetos, posters, revistas, brinquedos, repetidos de suas coleções do tema, à venda em consignação. 

Quando o jornal fechou, nós já havíamos levado duas turmas em excursão a Los Angeles, nos Estados Unidos, para participarem de convenções de “Star Trek”. Eu era o organizador, tradutor e intérprete, para reservar hotel, ingressos para o evento e outros passeios, alugar carro, dirigir e traduzir cardápios em restaurantes para todo mundo, que chegava a 20 pessoas. Além disso, havíamos participado ou ajudado diretamente na organização de encontros em São Paulo. A publicação do fã-clube, o “Diário de Bordo”, era editado por mim (na verdade era um rodízio, a cada edição, alguém editava, entre outros dois jornalistas).

Com o fim do Jornal do Centro, assumimos essa atividade e inauguramos o “site”  www.ussbrazil.com em 1997, com várias ramificações até hoje.  Além de Star Trek, adotamos outros temas, como “Xena, a Princesa Guerreira”, sobre o qual organizei cinco encontros de fãs em São Paulo e fomos a duas convenções na Califórnia. Fomos a um total de 7 convenções nos EUA e organizamos ou ajudamos em muitas em São Paulo e até em Campinas, em Jundiaí e em Santos. Passei a dar entrevistas para jornais, revistas e programas de TV, jornais de TV e fui entrevistado para o documentário americano "Trekkies 2", falando em inglês, que foi exibido na Mostra Internacional de Cinema, de São Paulo, em 2005.

Depois que o jornal “A Tribuna”, de Nova Granada passou a ser impresso em offset, passei a colaborar com uma charge semanal, sobre assuntos atuais do Brasil, só para não perder o jeito. Para a Carga Pesada, desde 1990, criei o Bruto, um mascote “todo roxo”, simbolizando o caminhoneiro, que é como cachorro, que dorme fora de casa e faz xixi no pneu, e uma paródia do presidente Fernando Collor de Mello, que disse em um discurso que, quando nasceu tinha o saco roxo, pois era macho, segundo a tradição nordestina. Então o caminhoneiro-cachorro era roxo inteiro. Depois de um tempo, o Bruto ganhou um parceiro para interagir, o gato amarelo (homenagem a meu gato  na infância) “Chapa”, que é o intermediário nas cargas, o sujeito que ganha com o esforço do caminhoneiro.

Um segundo livro de charges minhas chegou a ser preparado (eu tenho os fotolitos em algum lugar), pois a editora (a mesma do livro anterior, a Verbo, que virou Verso) faliu com o Plano Collor e eu deixei para lá, a vida tomou outros rumos. Iria de chamar “Nova Ré Publica” e tinha uma caricatura do José Sarney na capa, marrom (cor que o Sarney odeia), sentado a uma mesa, com a placa em cima da mesa: “José Ribamar Ferreira de Araújo Costa – presidente”.

Em 2001, um dos fãs de Star Trek, que me conhecia das convenções (em algumas, trouxemos atores americanos do seriado para interagir com o público) e sabia das minhas habilidades de falar em público e em inglês, assumiu a direção de um programa de TV, “Televestibular”, na Rede Mundial (da Legião da Boa Vontade). O programa eram aulas de todas as disciplinas, geografia, história, português etc. Ele precisava de alguém que desse aula de inglês, mas estava tendo dificuldade, pois os professores de inglês que tinham feito teste até então, “travavam” diante da câmera. Ele me convidou para fazer um teste, fui aprovado, e gravei, sob contrato, 30 programas de meia-hora, aos sábados. O programa ia ao ar às 7h da manhã de quartas-feiras, com transmissão a partir de São José dos Campos para cima. Eu recebi e-mail de “consultas e dúvidas” de telespectadores de Minas Gerais, Espírito Santo e Bahia. Talvez o programa esteja sendo reprisado até hoje, pois o assunto não fica velho.

Em 2001 também foi o ano que me separei da segunda esposa, mas mantivemos vários vincos, como o a ussbrazil e a filha. O programa de TV da LBV me “pegou”. Gostei do meio. Fui fazer alguns cursos: de apresentação de TV, de telejornalismo e de videorrepórter.

Em 2004, editei um livro para o meu pai, “Santa Casa de Nova Granada – 60 anos”, que foi impresso com patrocínio do Bradesco, cheio de fotos da história toda. Ele é provedor ainda, desde 1968.

Em 2006, apresentei uma proposta de programa de TV para a www.alltv.com.br, uma “emissora de televisão” na internet, com programas ao vivo, interativos em tempo real, com audiência em qualquer lugar do mundo. Faz quase 7 anos que, minha amiga do coração (há 11 anos) Vivian Guilhem e eu fazemos o “Programa São” (“são” de saudável, de sadio), fazendo muita piada, falando de séries de TV, cinema e desenhos animados, muitas vezes com entrevistados, e divulgando a ussbrazil (www.ussbrazil.com/programasao), com uma hora de duração, semanal.

Também em 2006, influenciado pela namorada (agora esposa e mãe do meu filho) fui fazer pós-graduação na Cásper Líbero. Em 2009, virei professor universitário (um amigo e aluno de inglês levou meu currículo para um amigo coordenador pedagógico e tudo começou daí), primeiro na Estácio (onde ainda faço parte do corpo docente, mas não me atribuíram aula) e, desde o início de 2012, na FMU (FIAM/FAAM), onde um dos coordenadores é fã de Star Trek, frequentador de convenções, cliente da ussbrazil, eu o guiei em uma excursão a uma convenção “trekker” na Califórnia e foi também meu aluno de inglês (e a filha dele, aluna de jornalismo na FMU, também).

Atualmente, além das aulas universitárias, das aulas particulares de inglês (tenho alunos das 7h da manhã até 23h), das ilustrações e reportagens para a Carga Pesada, do programa semanal na ALLTV, deste blog,  das compras e atualizações do site da ussbrazil e dos quatro filhos (dois humanos e dois gatos), eu acabo de terminar uma tese que ando escrevendo desde 2009 e que ainda não sei para que seria. O tema é a semelhança dos povos da polinésia (passei a lua-de-mel na Nova Zelândia, entre os Maõri, na virada de 2007/2008) com os indígenas brasileiros, tanto nos traços fisionômicos (como os das minha mulher, que é o Ceará e foi confundida pelos Maõris como “prima”), como na língua. 
Tenho 28 anos de relacionamento com a editora da revista Carga Pesada, Dilene Antonucci. A única mulher que a supera em tempo, na minha vida, é minha mãe. Uma vez, faz tempo, a Denise Paiva, assessora de imprensa da Braspress (uma empresa pela qual tenho carinho) fez a seguinte observação: "o Ralfo é o soldado em São Paulo da general Dilene, lá de Londrina". Boa. Nunca esqueci. Talvez a distância ajude um relacionamento a durar...


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